UM CAMPO EM QUE SÓ O LADO DA UNITA TEM BALIZA

A UNITA apontou hoje discrepâncias de mais de 500 mil votos nas eleições angolanas e afirmou que 347 mil lhes foram subtraídos (roubados), alterando, a seu favor, os resultados anunciados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE/MPLA). Definitivamente Angola deixou de ser um país e passou a ser, apenas e só, um reles bordel muito, mas muito mesmo, mal frequentado.

Segundo Adalberto da Costa Júnior, líder da UNITA, que hoje apresentou os dados em Luanda, a contagem dos votos realizada com base nas actas síntese em posse da UNITA pode introduzir alterações nos resultados. Poderia, de facto, se Angola fosse o que ainda não conseguir ser nos últimos 47 anos, um Estado de Direito Democrático.

“Os dados apurados pelo centro de contagem e apuramento da UNITA revelam diferenças enormes e inaceitáveis daqueles publicados pela CNE”, destacou Adalberto da Costa Júnior.

Segundo os números apresentados, 347.436 votos foram subtraídos (roubados) à UNITA em 15 círculos provinciais e 185.825 foram acrescidos ao MPLA (dono do reino há 47 anos) em 16 círculos provinciais, uma soma de 533.261 votos.

“Um número capaz de produzir alterações nos resultados definitivos divulgados pela CNE com reflexo bastante visível no número de mandatos nos círculos provinciais e no círculo nacional e naturalmente nos resultados finais”, disse o presidente da UNITA, hoje em Luanda numa declaração aos jornalistas.

Os resultados definitivos anunciados na semana passada pelo MPLA através da sua sucursal (CNE) deram a vitória, com maioria absoluta, ao MPLA, com 51,17% dos votos, um resultado contestado pela UNITA, que obteve 43,95%. Com estes resultados o MPLA elegeu 124 deputados e a UNITA elegeu 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.

Mas de acordo com Adalberto da Costa Júnior, se forem adoptados os resultados definitivos publicados pela CNE, e acrescer ao resultado da UNITA os votos subtraídos (347.436 votos), o partido passaria de 2.756.786 votos (anunciados pela CNE), para 3.104.222 votos correspondentes a 49,5% e; se subtrair ao resultado do MPLA, os votos a mais que lhe foram atribuídos (185.825 votos), esta força política desceria de 3.209.409 atribuídos pela CNE para 3.023.584 votos, correspondentes a 48,2%, o que significa que perderia as eleições.

Só em Luanda, a contagem da UNITA aponta para uma diferença de 214.679 votos subtraídos (roubados), estando neste momento a ser divulgadas publicamente as actas em posse do partido, exemplificou.

“As actas que sustentam a contagem do escrutínio paralelo da UNITA podem ser consultadas. O sistema que as processou pode também ser auditado”, sublinhou o dirigente, que apontou também ilegalidades relacionadas com o excesso do número de votantes, existência de duas actas síntese para uma mesma assembleia de voto e não publicação dos cadernos eleitorais conforme a lei.

“As discrepâncias acima evidenciadas, indiciam a existência de manipulação dolosa dos resultados, o que só se pode esclarecer mediante comparação com as actas em posse dos concorrentes e da CNE”, declarou Adalberto da Costa Júnior.

O líder da UNITA considerou que as violações à lei apontadas “promoveram a obstrução do direito ao voto, com impacto nos resultados eleitorais”, e defendeu que estes actos devem ser alvo de responsabilização criminal dos seus autores, titulares de funções públicas.

RECORDANDO O MPLA, CNE, INDRA E OUTRAS SANTAS VIRGENS

A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) de Angola (uma das emblemáticas sucursais do MPLA) descartou no passado dia 11 de Fevereiro que a escolha da empresa espanhola INDRA para apoiar (o MPLA a vencer) as eleições comprometa a lisura do acto e salientou que o afastamento da outra concorrente se deveu ao incumprimento das regras.

O porta-voz da CNE, Lucas Quilundo, falava em conferência de imprensa, após a 2ª reunião extraordinária do órgão, onde foram apresentados os resultados dos concursos públicos lançados no final de 2021, relativos ao transporte da logística eleitoral directa e inversa e para aquisição dos serviços de solução tecnológica e logística eleitoral.

Segundo Lucas Quilundo, dez empresas adquiriram o caderno de encargos relativo à solução tecnológica, mas apenas duas apresentaram propostas, tendo sido excluída a da SmartMatic, por ter sido entregue num envelope com identificação da empresa, violando as regras do concurso.

“A proposta deve ser colocada num envelope opaco para que não se tenha a menor ideia de quem seja o proponente e não deve ter elementos de identificação do concorrente”, princípio que, segundo disse o porta-voz da CNE, não terá sido respeitado pela SmartMatic. E quando toca à INDRA, a CNE não facilita.

“Como o objectivo numa competição é apurar um vencedor naturalmente que a proposta restante era esta [INDRA] que foi objecto de avaliação e adjudicação para celebração de contrato”, afirmou.

Questionado sobre se a reputação da INDRA, cuja idoneidade (similar à do MPLA) foi posta em causa pela oposição angolana, que relaciona a empresa com fraudes eleitorais, o responsável da CNE adiantou que “essas questões são alheias à CNE” e marginais ao concurso, já que, formalmente “não tem conhecimento de qualquer impedimento legal que pudesse pôr em causa o direito desta empresa se apresentar a concurso”.

E Lucas Quilundo tem razão. Se o Presidente do MPLA viu roubar, participou no roubo, beneficiou do roubo mas não é ladrão, também a INDRA não é ladrão embora seja perita em ver roubar, participar nos roubos e beneficiar dos roubos. Fica tudo em família. É tudo “cosa nostra”.

“Não é do interesse da Comissão Nacional Eleitoral nem de ninguém que o processo seja ensombrado de qualquer maneira, mas temos de nos ater aos factos, a CNE lança um concurso e apresentam-se dois concorrentes, um é eliminado, é assim em qualquer competição, ainda que tivesse havido mais concorrentes só um sobraria e prevaleceu a INDRA”, reiterou, considerando que, quanto às questões reputacionais, compete à INDRA vir em sua defesa.

“Não compete à CNE fazer avaliações subjectivas em relação aos concorrentes (…) é do interesse que o processo eleitoral decorra com a máxima lisura e é isso que a CNE está a fazer, é esse o compromisso que tem”, vincou, sublinhando que foram seguidos os critérios do concurso.

Lucas Quilundo referiu ainda que a empresa excluída apresentou uma reclamação, que foi indeferida, tendo interposto recurso hierárquico para o órgão máximo da CNE (plenário), que foi novamente indeferido. Pudera!

Segundo explicou, a empresa alegou que “as condições em que apresentou a sua proposta podia ter sido aceite e a comissão de avaliação concluiu que a empresa tinha violado essas normas”, pelo que a proposta não foi admitida nem aberta. “A CNE não sabe o que está lá”, completou Lucas Quilundo. É mesmo isso. Em equipa que ganha (MPLA, CNE, INDRA, Tribunal Constitucional etc.) não se mexe.

Quanto ao concurso para o transporte da logística eleitoral, levantaram o caderno de encargos seis empresas, das quais quatro apresentaram propostas, tendo duas sido eliminadas por inobservância das regras.

Para a preparação das eleições foram ainda criadas seis comissões de avaliação que procederam à aquisição de serviços relacionados com materiais para a educação cívica, ‘kits’ de iluminação e geradores, viaturas, mapeamento das assembleias de voto, elaboração dos cadernos eleitorais, construção da arquitectura do sistema de informação ao eleitor e aquisição de meios informáticos.

O porta-voz da CNE informou ainda que estava encerrado o concurso para instalação da infra-estrutura de telecomunicações para as eleições gerais que será instalada por uma entidade pública (Infosi, Instituto de Fomento para a Sociedade de Informação).

Em 9 de Maio de… 2017, partidos políticos da oposição reafirmaram ter sido ilegal a contratação de duas empresas, uma portuguesa (Sinfic) e outra espanhola (INDRA), pela CNE, para apoio tecnológico e material às eleições gerais de Agosto.

A convite da CNE deslocaram-se nesse dia àquele órgão eleitoral os então presidentes da CASA-CE, Abel Chivukuvuku, da FNLA, Lucas Ngonda, o vice-presidente da UNITA, Raul Danda, e o secretário-geral do PRS, Benedito Daniel, todos da oposição, e do MPLA (no poder desde 1975), António Paulo Cassoma.

Em causa estava a denúncia, pelos quatro partidos com assento parlamentar, UNITA, CASA-CE, PRS e FNLA, sobre a escolha “ilegal” das “mesmas” empresas Sinfic (Portugal) e INDRA (Espanha), que “participaram nas fraudes de 2008 e 2012”, para assessoria tecnológica das eleições gerais desse ano.

No final do encontro de esclarecimentos pela CNE, Abel Chivukuvuku referiu que foram ilegais a “contratação das duas empresas e a elaboração dos cadernos de encargo”.

“Pelo menos ficou provado, e é bom, que o presidente da CNE tenha compreendido isso e corrijam”, disse Abel Chivukuvuku, reiterando “a possibilidade de processar em Portugal e Espanha essas empresas que aceitaram participar em actos ilegais”.

Na mesma senda, o então vice-presidente da UNITA considerou ilegal o sistema de contratação, por não ter passado pelo plenário da CNE, por terem sido anunciados os vencedores do concurso quando o processo ainda se encontrava em fase de negociação para a sua conclusão.

“Viemos aqui convidados para uma sessão de esclarecimentos, mas tivemos tudo menos esclarecimentos. Era uma tentativa de se contar algumas histórias e a pensar que nós fossemos acreditar, infelizmente não”, disse o então vice-presidente do maior partido da oposição angolana.

Raul Danda sublinhou que os partidos queriam que “houvesse correcção das coisas”, para um processo “transparente e justo”.

“Porque é um processo sério e esse processo leva muitas vezes a instabilidade em outros países. Nós muitas vezes pensamos que Angola não é um país, é qualquer outra coisa um bocadinho acima dos outros países, não, e pode haver instabilidade sim, se o processo não corre bem e é preciso que se faça as coisas certas, nos termos da Constituição e da lei”, referiu.

Na sua intervenção durante o encontro, aberto à comunicação social, a pedido dos partidos, o presidente da FNLA foi directo na sua abordagem, questionando o então presidente da CNE, André da Silva Neto, sobre qual era a participação de angolanos nas empresas escolhidas.

“A discussão em torno das empresas INDRA e Sinfic é subjectiva, sabemos que uma é de direito espanhol e a outra português, quem são os angolanos associados nessas empresas? Estamos aqui com subjectividades, mas as questões concretas são essas, temos que analisar as coisas para encontramos soluções, a gincana jurídica é só para justificar as intervenções, mas as questões nuas e cruas são estas”, questionou.

Já o secretário-geral do MPLA disse ter registado que a CNE cumpriu os procedimentos legais estabelecidos para a contratação das empresas.

António Paulo Cassoma considerou que as dúvidas suscitadas pelos partidos relativamente à posição do plenário da CNE sobre esta matéria, poderia ser “facilmente ultrapassável”, tendo em conta que o processo estava ainda em fase de negociação para a sua conclusão.

E pronto. Todos jogam mas quem ganha sempre é o MPLA. E ganha sempre porque, para além dos jogadores, é o árbitro, é o VAR (Video-Árbitro), é dono da bola, do campo e do seu lado não há baliza. Por isso nunca sofre golos…

Folha 8 com Lusa

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